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Sobre a revisão da Lei de Cotas

publicado: 23/03/2022 10h09, última modificação: 23/03/2022 11h40

Estamos no ano do Bicentenário da Independência e, mais do que nunca, sob um cenário que ainda promove o racismo, cabe a pergunta: independência para quem? Os danos causados às sucessivas gerações de descendentes de pessoas negras escravizadas no processo de expansão colonialista europeia não se encerraram nem com o grito de liberdade às margens do Ipiranga nem com a abolição da escravidão. A herança maldita perdura ainda hoje, com as mazelas de uma sociedade excludente, que se constituiu sobre a égide do racismo, que se perpetua em duas esferas, estrutural e institucional.

Num ano emblemático como 2022, em que novamente lutamos pela nossa liberdade e nossos direitos, contra a face obscura de lideranças que disseminam preconceito e ódio, temos a missão de revisar a Lei de Cotas, Lei nº 12.711 de 2012, projeto do qual tenho a honra, como pessoa preta, de ser relator. Não é apenas uma revisão. É um marco.

Racistas estão saindo do armário e promovendo atrocidades contra pessoas pretas. Querem, ainda, acabar com essa legislação que veio para trazer uma reparação histórica nos últimos 10 anos. A Lei de Cotas é uma norma que vem transformando a realidade de milhares de brasileiros.

É importante ressaltar que, entre 2011 e 2018, o número de alunos negros matriculados em universidades públicas passou de 11% para 50,3%, segundo o IBGE. Um avanço significativo, mas ainda há muito o que fazer.

Ainda é preocupante a evasão escolar entre jovens pretos. Do total de estudantes que abandonam a escola, 71,7% são negros. Os dados do mercado de trabalho também revelam uma desigualdade preocupante. Negros ganham 17% menos que brancos nas mesmas condições sociais, 47,4% dos negros estão na informalidade, enquanto o percentual de brancos é de 34%. Somos maioria na taxa de desemprego (71% maior que entre brancos) e minoria nas lideranças (menos de 5% das pessoas pretas ocupam cargos de liderança).

A revisão da Lei de Cotas deve ser feita com amplo debate em torno da matéria, mas para aperfeiçoá-la e não para acabar com esse importante instrumento de reparação histórica e acesso a um sistema econômico e social igualitário à população negra do País. É preciso melhorar os instrumentos de avaliação e monitoramento periódico da política para garantir maior efetividade.

Os números dos últimos 10 anos apontam que essa importante política precisa se atentar ao tripé da trajetória acadêmica dos cotistas: acesso-permanência-êxito. Vamos trabalhar para que ela seja a ferramenta de inserção, acesso e oportunidade que a população negra anseia e precisa, após anos de segregação e violência.

Texto do Deputado Federal Bira do Pindaré.